Moreno Veloso concilia a vivacidade do samba com a serenidade de canções-mantras no álbum ‘Mundo paralelo’

Artista põe o pai Caetano Veloso e a tia Maria Bethânia na roda deste disco gravado entre Lisboa e Rio de Janeiro sem perder a Bahia de vista. Moreno Veloso lança hoje o primeiro álbum de músicas inéditas em dez anos, ‘Mundo paralelo’, com dez músicas, sendo sete inéditas em disco Caroline Bittencourt / Divulgação Capa do álbum ‘Mundo paralelo’, de Moreno Veloso Arte de Tomás Cunha Ferreira Resenha de álbum Título: Mundo paralelo Artista: Moreno Veloso Edição: Edição independente de Moreno Veloso Cotação: ★ ★ ★ ★ ♪ Enquanto Zeca Veloso tem feito show solo em que revela algumas músicas inéditas que compõem o repertório autoral do aguardado álbum de estreia do segundo dos três filhos de Caetano Veloso, o primogênito Moreno Veloso volta ao mercado fonográfico com o lançamento do primeiro álbum de músicas inéditas em dez anos, Mundo paralelo, com a carreira já consolidada. Em rotação a partir de hoje, 9 de maio, com dez faixas, o sucessor do álbum Coisa boa (2014) mostra Moreno em equilíbrio entre a vivacidade do samba de tempero baiano e a serenidade de canções que soam como mantras. Em alguns momentos, os climas podem soar repetitivos, tangenciando a apatia se o ouvinte não estiver imerso no universo particular deste artista nascido em Salvador (BA) em novembro de 1972. Feito o alerta, é justo reconhecer que Mundo paralelo é álbum repleto de belezas captadas em estúdios das cidades de Lisboa (Portugal) e Rio de Janeiro (RJ, Brasil) com produção musical orquestrada pelo próprio Moreno Veloso. O naipe de músicos arregimentados em Lisboa – Domenico Lancellotti (bateria e glockenspiel), Pedro Sá (guitarra), Ricardo Dias Gomes (baixo e sintetizador) e Rodrigo Bartolo (sintetizadores) – está na base da sonoridade que se afina com a discografia solo de Moreno, iniciada com o álbum Máquina de escrever música (2000). Um dois e já (Moreno Veloso e Quito Ribeiro), canção formatada com a voz de Nina Becker e influências do Japão e Mali, exemplifica a canção que flui como mantra em clima de serenidade. Nesse universo de quietude, Bailando parece cruzar a alma de Caetano Veloso no álbum Fina estampa (1994) com os climas inebriantes da obra minimalista de João Gilberto (1931 – 2019). Canção afetuosa, Bailando é versão em espanhol, escrita por Bruno Di Lullo com Moreno, de Mexican dream (1970), tema feito pelo compositor italiano Piero Piccioni (1921 – 2004) para o filme Colpo rovente (1970). Lançado por Moreno no álbum de intérprete lançado há três anos no formato de voz e violão, Every single night (2021), o acalanto Unga dorme nesse frio (Moreno Veloso) se sustenta na base mântrica formada pelo violão de Moreno, o violoncelo de Jaques Morelenbaum e o berimbau de Marcelo Costa. Unga é palavra de raiz nórdica que significa jovem. Bafejada pelos sopros de Thiago Queiroz, Vista da janela (Moreno Veloso e Quito Ribeiro) descortina a leveza que pauta disco em que Moreno rebobina Ninguém viu (Moreno Veloso e Quito Ribeiro, 2018), canção registrada há seis anos no álbum e DVD que eternizam o show Ofertório (2017). No terreno dos sambas, há três pérolas. A donzela se casou (Moreno Veloso) é o típico samba de roda do Recôncavo Baiano levado no prato e faca friccionados por Moreno tendo como base o baticum luxuoso do percussionista Kainã do Jêje. Na gravação de A donzela se casou, a voz de Moreno se une aos cantos do pai Caetano Veloso, da tia Maria Bethânia e dos irmãos Tom Veloso e Zeca Veloso, reeditando o envolvente coro e clima familiar visto em 2022 na apresentação deste samba na live comemorativa dos 80 anos de Caetano. Em andamento e universo similares, É de hoje é samba-exaltação com letra em que Moreno Veloso alinha signos alusivos à cultura do Recôncavo Baiano. Os versos foram escritos a partir da cativante melodia enviada ao artista pelo carioca Luís Filipe de Lima, parceiro na composição. Já a música-título Mundo paralelo (Moreno Veloso, Tiganá Santana e Carlos Rennó, 2023) é samba-reggae que exalta o Ilê Aiyê – cinquentenário bloco afro-baiano entranhado na formação musical de Moreno – e que anunciou o álbum ao ser lançado em dezembro como single. Na gravação, o baticum típico do gênero é atravessado por guitarras e pela voz grave de Tiganá Santana – símbolo da ancestralidade afro-brasileira – na récita de texto do próprio Tiganá. Já o samba Um presente de Natal (Moreno Veloso e Quito Ribeiro) vem embalado com a bossa que também percorre todo o cancioneiro de Moreno Veloso, artista de personalidade tão forte que conseguiu trazer canção de Marina Lima e Antonio Cicero – Deixa estar, carro-chefe do álbum Pierrot do Brasil (1998) – para o universo particular do álbum Mundo paralelo, alterando o D.N.A. musical de Marina e dando tom reflexivo à composição. Enfim, Mundo paralelo é coisa boa porque reproduz os genes da música de Moreno Veloso, artista que fez nome e carreira longe da sombra gigante do pai, mas sem nunca renegar o nobre D.N.A. familiar.

Moreno Veloso concilia a vivacidade do samba com a serenidade de canções-mantras no álbum ‘Mundo paralelo’

Artista põe o pai Caetano Veloso e a tia Maria Bethânia na roda deste disco gravado entre Lisboa e Rio de Janeiro sem perder a Bahia de vista. Moreno Veloso lança hoje o primeiro álbum de músicas inéditas em dez anos, ‘Mundo paralelo’, com dez músicas, sendo sete inéditas em disco Caroline Bittencourt / Divulgação Capa do álbum ‘Mundo paralelo’, de Moreno Veloso Arte de Tomás Cunha Ferreira Resenha de álbum Título: Mundo paralelo Artista: Moreno Veloso Edição: Edição independente de Moreno Veloso Cotação: ★ ★ ★ ★ ♪ Enquanto Zeca Veloso tem feito show solo em que revela algumas músicas inéditas que compõem o repertório autoral do aguardado álbum de estreia do segundo dos três filhos de Caetano Veloso, o primogênito Moreno Veloso volta ao mercado fonográfico com o lançamento do primeiro álbum de músicas inéditas em dez anos, Mundo paralelo, com a carreira já consolidada. Em rotação a partir de hoje, 9 de maio, com dez faixas, o sucessor do álbum Coisa boa (2014) mostra Moreno em equilíbrio entre a vivacidade do samba de tempero baiano e a serenidade de canções que soam como mantras. Em alguns momentos, os climas podem soar repetitivos, tangenciando a apatia se o ouvinte não estiver imerso no universo particular deste artista nascido em Salvador (BA) em novembro de 1972. Feito o alerta, é justo reconhecer que Mundo paralelo é álbum repleto de belezas captadas em estúdios das cidades de Lisboa (Portugal) e Rio de Janeiro (RJ, Brasil) com produção musical orquestrada pelo próprio Moreno Veloso. O naipe de músicos arregimentados em Lisboa – Domenico Lancellotti (bateria e glockenspiel), Pedro Sá (guitarra), Ricardo Dias Gomes (baixo e sintetizador) e Rodrigo Bartolo (sintetizadores) – está na base da sonoridade que se afina com a discografia solo de Moreno, iniciada com o álbum Máquina de escrever música (2000). Um dois e já (Moreno Veloso e Quito Ribeiro), canção formatada com a voz de Nina Becker e influências do Japão e Mali, exemplifica a canção que flui como mantra em clima de serenidade. Nesse universo de quietude, Bailando parece cruzar a alma de Caetano Veloso no álbum Fina estampa (1994) com os climas inebriantes da obra minimalista de João Gilberto (1931 – 2019). Canção afetuosa, Bailando é versão em espanhol, escrita por Bruno Di Lullo com Moreno, de Mexican dream (1970), tema feito pelo compositor italiano Piero Piccioni (1921 – 2004) para o filme Colpo rovente (1970). Lançado por Moreno no álbum de intérprete lançado há três anos no formato de voz e violão, Every single night (2021), o acalanto Unga dorme nesse frio (Moreno Veloso) se sustenta na base mântrica formada pelo violão de Moreno, o violoncelo de Jaques Morelenbaum e o berimbau de Marcelo Costa. Unga é palavra de raiz nórdica que significa jovem. Bafejada pelos sopros de Thiago Queiroz, Vista da janela (Moreno Veloso e Quito Ribeiro) descortina a leveza que pauta disco em que Moreno rebobina Ninguém viu (Moreno Veloso e Quito Ribeiro, 2018), canção registrada há seis anos no álbum e DVD que eternizam o show Ofertório (2017). No terreno dos sambas, há três pérolas. A donzela se casou (Moreno Veloso) é o típico samba de roda do Recôncavo Baiano levado no prato e faca friccionados por Moreno tendo como base o baticum luxuoso do percussionista Kainã do Jêje. Na gravação de A donzela se casou, a voz de Moreno se une aos cantos do pai Caetano Veloso, da tia Maria Bethânia e dos irmãos Tom Veloso e Zeca Veloso, reeditando o envolvente coro e clima familiar visto em 2022 na apresentação deste samba na live comemorativa dos 80 anos de Caetano. Em andamento e universo similares, É de hoje é samba-exaltação com letra em que Moreno Veloso alinha signos alusivos à cultura do Recôncavo Baiano. Os versos foram escritos a partir da cativante melodia enviada ao artista pelo carioca Luís Filipe de Lima, parceiro na composição. Já a música-título Mundo paralelo (Moreno Veloso, Tiganá Santana e Carlos Rennó, 2023) é samba-reggae que exalta o Ilê Aiyê – cinquentenário bloco afro-baiano entranhado na formação musical de Moreno – e que anunciou o álbum ao ser lançado em dezembro como single. Na gravação, o baticum típico do gênero é atravessado por guitarras e pela voz grave de Tiganá Santana – símbolo da ancestralidade afro-brasileira – na récita de texto do próprio Tiganá. Já o samba Um presente de Natal (Moreno Veloso e Quito Ribeiro) vem embalado com a bossa que também percorre todo o cancioneiro de Moreno Veloso, artista de personalidade tão forte que conseguiu trazer canção de Marina Lima e Antonio Cicero – Deixa estar, carro-chefe do álbum Pierrot do Brasil (1998) – para o universo particular do álbum Mundo paralelo, alterando o D.N.A. musical de Marina e dando tom reflexivo à composição. Enfim, Mundo paralelo é coisa boa porque reproduz os genes da música de Moreno Veloso, artista que fez nome e carreira longe da sombra gigante do pai, mas sem nunca renegar o nobre D.N.A. familiar.